A necessidade de proteger e conservar a biodiversidade e os recursos naturais tem vindo a assumir um papel de destaque, uma prioridade e uma preocupação generalizada na comunidade científica.

Cada vez mais, na sociedade actual, face às constantes ameaças e impactes negativos inerentes ao desenvolvimento. A maior parte dos estudos de conservação realizados em Portugal, incide sobre as comunidades faunísticas e florísticas, nos diversos ecossistemas naturais ou antrópicos, menosprezando a importância, riqueza e diversidade das comunidades micológicas associadas aos mesmos sistemas, bem como dos factores que as ameaçam.

Os fungos assumem um papel fundamental ao nível do equilíbrio dos ecossistemas, contribuindo para a reciclagem da matéria orgânica (sapróbios), eliminando as espécies vegetais menos saudáveis (parasitas) e favorecendo o estabelecimento das espécies vegetais em condições adversas através de relações de simbiose (micorrízicos). Estas relações que se estabelecem entre os fungos e as raízes das plantas são igualmente importantes na manutenção da fitossanidade do sistema, protegendo as espécies vegetais de agentes patogénicos.

Apesar destes organismos serem quase imperceptíveis, formados por novelos de filamentos celulares (vulgarmente denominados por bolores), algumas espécies investem em estruturas reprodutoras bem conhecidas – os cogumelos. Estes assumem uma panóplia de complexidades, no que respeita às formas, cheiros, texturas, colorações, bastante curiosas e apelativas. No entanto, o facto dos cogumelos surgirem e desaparecerem de uma forma quase instantânea, para alguns mística até, e de possuírem propriedades medicinais, alucinogénicas e/ou tóxicas, fomentou o desenvolvimento de um sentimento de micofobia ou micofilia, que varia geograficamente.

 Em Portugal, apesar do generalizado sentimento de micofobia, prevalece uma importante tradição de colheita intrínseca à cultura de cada região e um conhecimento empírico de identificação de algumas espécies de cogumelos, que é aplicado, principalmente, na recolha de cogumelos comestíveis para auto-consumo. A exploração racional deste recurso, até agora considerado como uma fonte de rendimento marginal, poderia constituir uma mais-valia, em particular nos sistemas florestais menos intervencionados, contribuindo para a economia das regiões.

Não obstante à importância ecológica e económica dos fungos produtores de cogumelos, a escassez de estudos científicos desenvolvidos neste domínio, traduz-se num conhecimento diminuto sobre o património etnomicológico e a riqueza específica de cada região. Deste modo, urge incentivar os estudos micológicos e a regulamentação da colheita de cogumelos comestíveis, de forma a identificar claramente as espécies que poderão constituir um recurso natural economicamente rentável, identificando e salvaguardando os grupos potencialmente ameaçados. Estas iniciativas tornam-se indispensáveis se se pretender conciliar uma maior rentabilização sustentável dos ecossistemas, mediante a aplicação de um plano adequado de gestão, que vise a protecção da diversidade e a valorização dos recursos existentes nesses sistemas.

Numa tentativa de colmatar esta lacuna, o Departamento de Biologia da Universidade de Évora tem realizado estudos que visam contribuir para a avaliação e divulgação da riqueza específica de fungos e do património etnomicológico da região Sul e, mais concretamente, do Alentejo.

Celeste Santos e Silva (Prof.ª Auxiliar da Universidade de Évora)
Instituto de Ciências Agrárias Mediterrânicas, Departamento de Biologia