Facilmente identificável uma vez que possui um aspecto semelhante a um cão de grandes dimensões. No entanto, como resultado da sua extensa área de ocorrência, o lobo apresenta uma grande variação de tamanho: as subespécies que habitam os desertos da Península Arábica podem pesar somente 13kg, enquanto que as que ocorrem na Tundra Árctica podem atingir os 78kg, tornando-os os canídeos selvagens de maiores dimensões. Em Portugal ocorre uma subespécie endémica da Península Ibérica, o lobo-ibérico (Canis lupus signatus), cujos indivíduos adultos possuem, em média, um comprimento de 140cm, uma altura ao garrote de 70-80cm e um peso de 35-55kg, sendo as fêmeas geralmente mais pequenas. O lobo-ibérico caracteriza-se por possuir uma pelagem de coloração dominante cinzenta e castanha, com manchas faciais brancas bem evidentes e as canelas das patas anteriores com uma característica mancha negra. Possui uma pelagem densa durante o Inverno mas bastante rala no Verão, o que lhe confere um aspecto mais magro e escanzelado.

Distribuição e Habitat:
O lobo é o mamífero terrestre mais amplamente distribuído e um dos mais adaptáveis. Esta espécie é capaz de tolerar uma ampla variação de condições ambientais, como temperaturas de -56ºC a + 50ºC, e habitar todos os tipos de paisagens, desde desertos a tundras. Originalmente, esta espécie encontrava-se distribuída por todo o hemisfério Norte, acima de 15ºN latitude na América do Norte e de 12ºN na Índia e Arábia Saudita. No entanto, a partir da Idade Média, inicia-se uma intensa perseguição por parte do Homem, a qual reduziu a área de ocorrência original do lobo em cerca de um terço, e levou à sua extinção no Japão e na maioria da Europa Ocidental e Central, China, sub-continente Indiano, México e Estados Unidos da América.
No início do século XX o lobo-ibérico ocorria por quase todo Portugal, iniciando-se nessa altura por causas humanas, uma regressão da sua distribuição, do litoral para o interior e de Sul para Norte. Ainda durante a década de 1960, o lobo existia praticamente em todo o território português (nomeadamente no Algarve, Alentejo e vale do Tejo, muito próximo de Lisboa), o que demonstra a alarmante regressão que esta espécie sofreu ao longo do século XX (Figura 1). No entanto, esta regressão populacional parece ter-se atenuado nos últimos anos.


Figura 1 – Evolução da distribuição do lobo em Portugal, ao longo do século XX.
(Fonte: Grupo Lobo / Adaptado de Petrucci-Fonseca, 1990; ICN, 1997)

De acordo com o último censo nacional de lobo, efectuado em 2002/2003, a população lupina em Portugal distribui-se por cerca 20.000Km2, sendo estimada em 65 alcateias, o que corresponde aproximadamente a 300 lobos (Figura 2). Actualmente, o lobo subsiste somente nas serras mais agrestes do Norte e Centro de Portugal (caracterizadas por uma baixa densidade populacional humana e por uma importante actividade agro-pecuária), tendo os seus principais e mais estáveis núcleos de ocorrência nas montanhas que constituem o Parque Nacional da Peneda-Gerês, o Parque Natural de Montesinho e o Parque Natural do Alvão. Estes três núcleos lupinos, devido à sua estabilidade, são uma fonte regular de animais dispersantes, tendo por isso uma influência determinante na manutenção das alcateias que ocorrem nas regiões envolventes, caracterizadas por uma maior instabilidade. A distribuição do lobo em Portugal não é contínua, uma vez que existem duas populações separadas: uma a Norte do Rio Douro, que é estável e está conectada com a restante população lupina espanhola (estimada em cerca de 2500 indivíduos); e outra pequena e isolada população a Sul do Rio Douro, com aproximadamente 30 lobos que se encontram em eminente perigo de extinção.


Figura 2 – Área de distribuição e localização das alcateias em Portugal, em 2002/2003.
(Adaptado de Pimenta et al., 2005)

Biologia:
O lobo é um animal social, que vive em grupos familiares – as alcateias – constituídas normalmente por um casal reprodutor e seus descendentes directos (crias desse ano ou de anos anteriores). As alcateias são constituídas por cerca de 3 a 12 animais que ocupam um território definido (cuja dimensão, em Portugal, varia entre 150 e 300 km2), variando o efectivo da alcateia e a dimensão do seu território ao longo do ano e encontrando-se dependente da disponibilidade de alimento e do nível de perseguição que o Homem lhe move. Os lobos reproduzem-se unicamente uma vez por ano, nascendo as crias (em média 5 cachorros por ninhada) em Abril/Maio, após cerca de dois meses de gestação (61 a 64 dias). A maturidade sexual em ambos os sexos é normalmente atingida a partir dos 22 meses de idade, embora os jovens possam adiar a maturação sexual enquanto permaneçam nas suas alcateias natais, como resultado da competição reprodutiva. As crias normalmente mantêm-se com os seus progenitores por 10 a 54 meses, dispersando da alcateia natal maioritariamente, com 1 a 2 anos de idade e durante o Outono/início do Inverno e Primavera.
Os lobos comunicam entre si através de um conjunto de sinais visuais, olfactivos e auditivos, como sejam marcações de excrementos e urina, esgravatados efectuados com a patas e vocalizações, como por exemplo, o uivo.
Trata-se de um animal carnívoro, alimentando-se preferencialmente de ungulados e grandes roedores. Em regiões onde se verifica a ausência ou raridade de espécies de ungulados silvestres (e.g. corço, veado, javali), o lobo preda animais domésticos, e em zonas humanizadas do Sul da Europa e da Ásia pode basear a sua alimentação em pequenos roedores e desperdícios humanos de lixeiras. Apesar de ter hábitos necrófagos, o lobo é essencialmente um predador que caça cooperativamente através de longas e persistentes perseguições, embora com uma reduzida (10-50%) taxa de sucesso predatório. Por essa razão este carnívoro tem a capacidade de ingerir numa só refeição cerca de 10kg de carne, e de poder não se alimentar durante várias semanas.
Sendo um predador de topo, o lobo exerce vários efeitos sobre outros componentes e processos do ecossistema onde se insere: i) o efeito sanitário, uma vez que ataca preferencialmente animais doentes ou debilitados; ii) o controlo ou limitação dos efectivos das populações-presa; iii) a estimulação da produtividade das populações-presa; iv) a disponibilização de alimento para um grande número de espécies necrófagas, e v) a predação sobre mesopredadores (e.g. cães e outros carnívoros de pequeno/médio porte). Desta forma, alterações na presença, abundância e comportamento predatório do lobo, podem conduzir a mudanças na dinâmica populacional das suas populações-presa, e consequentemente através dum efeito cascata, reflectirem-se em todo o ecossistema.

Apesar da reduzida área de distribuição do lobo a nível nacional, este apresenta uma grande variedade de características ecológicas, reflexo das condições do habitat onde ocorre e da capacidade de adaptação deste carnívoro. Desta forma, nas serras do noroeste de Portugal (área de influência do Parque Nacional da Peneda-Gerês) o lobo baseia a sua alimentação nos elevados efectivos de equinos e bovinos pastoreados em regime de liberdade, o que faz com que esta região se verifiquem os maiores prejuízos económicos causados pela predação do lobo na pecuária, a nível nacional. Pelo contrário, no nordeste de Portugal (zona Este do Parque Natural de Montesinho), a grande disponibilidade em número e densidades de presas silvestres (javali, corço e veado) faz com que o lobo baseie a sua alimentação nestes ungulados, não consumindo praticamente animais domésticos. Na região central de Trás-os-Montes, verifica-se uma situação intermédia, onde o lobo se alimenta basicamente dos únicos ungulados comuns nesta região: o javali e os pequenos ruminantes (caprinos e ovinos). Na região a Sul do rio Douro o lobo também segue uma conduta ecológica semelhante, embora recorra de forma frequente às lixeiras e vazadouros, apresentando assim um acentuado comportamento necrófago.

Estatuto de conservação:
Segundo a UICN, o lobo apresenta a nível Mundial, desde 1996, o estatuto de “Baixo Risco”, com indicação de dependente de conservação para a Península Ibérica, que constitui um dos seus últimos redutos na Europa Ocidental.
Em Portugal, o lobo está totalmente protegido desde 1988 (Lei 90/88 de 13 de Agosto, posteriormente regulamentada pelo Decreto-Lei 139/90 de 27 de Abril), sendo proibido o seu abate ou captura e a destruição ou deterioração do seu habitat. Há mais de uma década que o lobo é classificado como “Em Perigo de Extinção” no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal e encontra-se ainda incluído no Anexo II da CITES (Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies de Fauna e Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção) e no Anexo II da Convenção de Berna (Convenção Relativa à Conservação da Vida Selvagem e dos Habitats Naturais da Europa). A nível da Comunidade Europeia, o lobo é considerado uma espécie prioritária para a conservação segundo a Directiva Habitats.
Apesar de protegido, o lobo-ibérico enfrenta actualmente várias ameaças à sua sobrevivência, como sejam: i) a perseguição directa ilegal (principalmente através do tiro, veneno e laços) resultado da atitude negativa das populações rurais que convivem com o lobo; ii) a redução da disponibilidade de alimento (raridade das presas silvestres e diminuição dos efectivos pecuários); e iii) a crescente deterioração e fragmentação do seu habitat devido a incêndios ou à construção de infra-estruturas (e.g. redes viárias, barragens, parques eólicos).

Texto e fotos de Francisco Álvares