Em Dezembro de 2008 é publicada uma polémica “Tabela de Visitação” do ICNB. Sem alaridos, sem ninguém dar conta, que a informação não se quer para todos. Mas para desgraça do ICNB afinal houve quem notasse a tabela, que referia que qualquer tipo de fotografia ou filmagens em áreas protegidas ou do Domínio Público Marítimo estava sujeita a pagamentos até 25€ por hora. Parece que se tinham enganado, com a pressa de publicar a dita esqueceram-se de referir que apenas se tratava de fotografia ou filmagens no âmbito de actividades económicas. E assim surge a versão actual (link)

Mas o que são actividades económicas? A custo lá se consegue saber que é qualquer actividade que possa potencialmente dar lucro. Quem queira tirar umas fotos para publicar num livro de fotografia da natureza ou num guia de campo está sujeito a 100/200€ por dia de 7 horas mais 25€ por hora extra. Não se distingue a fotografia editorial da fotografia publicitária ou a fotografia da Natureza da fotografia de um novo modelo de automóvel. Citando uma resposta da sra. Paula Bártolo do ICNB “O que está em causa é tirar as fotos para serem vendidas, independentemente do local onde as mesmas sejam publicadas”.

Façamos as contas. Está para sair em breve um livro acerca dos habitats terrestres dos Açores. É composto principalmente por fotografia da minha autoria, acompanhada por textos que se querem curtos e objectivos. Uma forma de chamar a atenção das pessoas acerca dos aspectos mais desconhecidos dos Açores, levá-las a explorar novos caminhos, quem sabe, levar a uma mudança de atitudes. Levei 3 anos no campo a tirar fotos para este livro. No total, talvez 90 dias de 12 horas cada a fotografar nas 9 ilhas. Imaginando que tinha fotografado 50% do tempo em terrenos do ICNB ou DPM teria de pagar: (45 dias x 200) + (45 dias x 100) + (90 dias x 5 horas extra x 25) = 24750€. Nem nos meus melhores sonhos prevejo ganhar tanto dinheiro com os direitos de autor. Felizmente o ICNB não mete a mão nas ilhas.

Como biólogo, trabalhando precisamente na área da conservação há bastantes anos, é com um espanto renovado que vou assistindo ao que este organismo vai fazendo. Não serão os fotógrafos da Natureza os grandes responsáveis pela divulgação das nossas áreas protegidas? Não colaboram eles muitas vezes a custo zero com o ICNB? Não é pelos valores paisagísticos que muitas das nossas APs têm o estatuto que têm? Finalmente, não é a fotografia da Natureza uma das melhores “armas” que o ICNB tem para tentar fazer as populações compreender muitas restrições que se fazem? Será que as pessoas compreendem as restrições se nunca tiverem visto a beleza de um determinado local ou espécie? Será que alguém se vai movimentar quando um qualquer empreendimento quiser pôr em causa determinado valor ecológico, se ninguém conhece esse valor?

Há mais uma situação condenável criada pela nova tabela de preços do ICNB. A denúncia ambiental de muitas situações vividas nas APs e no DPM passa a ser enormemente dificultada. Não li nada acerca deste ponto e acho que será um dos mais preocupantes. Porquê? Imaginemos uma situação de violação da lei, por exemplo o despejo de resíduos dentro de uma destas áreas protegidas geridas pelo ICNB. Ou uma situação tão ou mais grave mas se calhar até legal, por exemplo, a laboração de pedreiras que ponham espécies em perigo. Uma das armas que qualquer ambientalista tem, talvez a mais eficaz, é a denúncia à comunicação social. Já me aconteceu o ICN não responder a algumas situações que lhes comuniquei e vi-me “forçado” a denunciá-las à televisão (por exemplo a luta Pedreiras vs. Anapistula (link)
na Arrábida que a pequena aranha continua a perder dia a dia (link).
Hoje em dia talvez fosse impossível fazer algo como a reportagem mencionada. Para filmar dentro de uma área protegida uma equipa de televisão tem agora de pedir autorização. Quando a conseguir terá de pagar e só depois poderá filmar dentro da AP. No tempo que isto leva será que o atentado já passou? E claro, se a autorização demorar 2 anos (como já me aconteceu para conseguir autorização para fazer estudos científicos) será que um órgão de comunicação social está disposto a esperar? Uma notícia com meses ou anos ainda é notícia? Ou será que este mesmo órgão estará disposto a pagar as eventuais multas que o ICNB lhes passe por filmarem atentados ambientais sem autorização? Não sei se o ICNB quer limitar a liberdade de imprensa e informação da população mas indirectamente é, sem dúvida, o que se passa actualmente. Será esta situação sustentável ou sequer legal/constitucional?

Tendo em vista todas estas preocupações, um grupo de fotógrafos da Natureza, nos quais me incluo, tentou obter esclarecimentos e agendar uma reunião com a direcção do ICNB. Já lá vai um mês, sem resposta. Assim, resolvemos tornar pública a carta enviada. Aqui fica. (link)

Texto e Fotos: Pedro Cardoso (http://naturgrafia.blogspot.com)

(Fotos do Parque Nacional da Peneda-Gerês, tiradas imediatamente antes da publicação da tabela)