Morfologia de Lutra lutra
Informação detalhada sobre Lutra lutra
Continente: Nativa, Protegida (Anexo II da Convenção de Berna, anexo I A da Convenção de Washington (CITES) e anexos II e IV Directiva Habitats (n.º 92/43/CEE), Não explorada embora por vezes surjam ilegalmente peles de lontra. Açores: Ausente. Madeira: Ausente. | |||
Ciclo de vida: | |||
Descrição geral: | |||
As lontras terão evoluído no sentido de uma adaptação aos sistemas aquáticos sendo atualmente caracterizadas pela sua morfologia adaptada a este tipo de sistemas. O seu corpo fusiforme e membros curtos aliado à sua cauda curta que afunila na ponta conferem-lhe um hidrodinamismo impar entre os carnívoros que habitam em Portugal. Com todas as patas providas de membranas interdigitais, a lontra está totalmente adaptada para nadar, podendo fazê-lo até 8 horas ininterruptamente. A espécie é ainda caracterizada pelo seu focinho largo, pequenas orelhas e uma pelagem de coloração castanha na maior parte do seu corpo que pode ser interrompida por uma mancha mais clara ou branca que se pode estender do queixo ao ventre. Com um comprimento (cabeça-corpo) que pode variar entre os 59 e 90 cm e uma cauda que pode alcançar os 47cm, a lontra é consideravelmente maior que os mustelídeos com que pode partilhar diretamente o seu habitat em Portugal, o visão-americano Neovison vison e o toirão Mustela putorius. Apresenta uma altura ao garrote que pode ir até aos 30cm e o seu peso em adulto oscila usualmente entre os 6 e os 10kg. As lontras ibéricas são menores do que as encontradas no centro e norte da Europa. |
Biologia
A espécie é essencialmente noturna com um período de inatividade a meio da noite, e é normalmente associada a zonas húmidas de água doce podendo ocorrer em rios, ribeiras, pauis, lagoas e albufeiras, contudo pode ocorrer também em ambientes salobros como os estuários ou mesmo frequentar ambientes de água salgada no litoral. Os habitats ripários são de sua preferência uma vez que proporcionam simultaneamente um fácil acesso ao meio aquático e refúgio. A vegetação e as árvores em redor de cursos de água são usualmente usadas para construir tocas ou camas onde descansam durante o dia. As tocas podem ser revestidas por vegetação seca e por vezes podem apresentar uma entrada subaquática para uma câmara seca com chaminé de arejamento.
A alimentação da espécie é maioritariamente constituída por peixes (ex. perca Perca fluviatilis, lúcio Esox lucius e a carpa Cyprinus carpio) embora possa predar sobre outros vertebrados como roedores, aves aquáticas, anfíbios, invertebrados e insectos. Em Portugal, a composição da dieta de lontra sofreu uma notória alteração após a introdução do lagostim-vermelho Procambarus clarkii durante os anos 70. Com a rápida invasão dos sistemas aquáticos de água doce da maior parte do território nacional pelo lagostim, este tornou-se um recurso básico na dieta da lontra. As partes não digeridas desta presa juntamente com restos ósseos de peixes consumidos são facilmente identificadas nas fezes deste predador que tendem a ser depositados em sítios muito característicos (ex. pontes e locais proeminentes no leito do rio) e usualmente visitados.
A deposição de excrementos é utilizada como forma de marcação territorial embora possam ser utilizadas outras marcas sensoriais como a deposição de secreções de cheiro almiscarado. Os machos adultos tendem a ser solitários e a possuir territórios de maior dimensões que sobrepõem aos territórios das fêmeas durante alguns dias do período de acasalamento e embora este possa ocorrer todo o ano tende a ser mais comum na primavera. As crias (1 a 5 por ninhada) nascem após um período de gestação que dura cerca de 60 dias. A progenitora juntamente com as crias de cada ano pode formar um grupo familiar. Na Península Ibérica têm sido mencionadas densidades entre 0.05 e 1.0 exemplares/km de rio.
Distribuição
A lontra apresenta uma distribuição maioritariamente euro-asiática, ocorrendo desde o norte de África até ao médio oriente, Sri Lanka, India e Indochina. Na Península Ibérica as lontras sofreram um forte declínio entre a década de 50 e 80 desaparecendo de vários rios de tipo mediterrânico, bem como de zonas mais turísticas, grandes planícies de agricultura intensiva e zonas em redor das grandes cidades. Este declínio ocorreu igualmente em várias outras regiões da Europa principalmente devido ao excessivo nível de poluentes, atividades humanas e destruição de habitat ripários. Desde os anos 80 a espécie tem vindo a recuperar a sua distribuição como por exemplo nos Pirinéus e Andaluzia. Embora sejam notadas variações morfológicas entre indivíduos provenientes de diferentes pontos da península e alguma variação genética tenha sido encontrada entre lontras do norte e sul da península não têm sido descritas subespécies. Na península ibérica a espécie encontra-se de forma sedentária desde o nível do mar até aos 1800m de altitude, acima desta altitude é consideravelmente condicionada pela presença de alimento.
Estatuto de conservação e ameaças
Ao nível internacional a lontra está classificada como Quase ameaçada (NT) pela União Internacional da Conservação da Natureza e está incluída no Anexo II da Convenção de Berna, no Anexo I A da Convenção de Washington (CITES) e nos Anexos II e IV Directiva Habitats (n.º 92/43/CEE). Em Portugal, a população é considerada estável tendo sido atribuído pelo Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal o estatuto de Pouco Preocupante (LC). A população é considerada como tendo uma distribuição alargada habitando numerosos sistemas aquáticos. Os fatores de ameaça para esta espécie estão fortemente ligados com a vulnerabilidade dos sistemas aquáticos em que habitam. A poluição, construção de barragens, implementação de aquaculturas e remoção de vegetação ripária são exemplos de atividades humanas que podem afetar seriamente a presença e persistência da lontra. A espécie é ainda vulnerável a atropelamentos.
Ações de conservação
Desde 1985, com intuito de criar uma população em cativeiro foi criado um Programa Europeu de Reprodução (EEP). Vários países Europeus estabeleceram protocolos de monitorização e alguns programas de reintrodução (ex. Reino Unido e Suécia) foram levados a cabo com sucesso. Em Espanha tem sido realizadas reintroduções, algumas com sucesso (ex. Girona), utilizando animais provenientes de outras províncias espanholas ou de Portugal.
Referências
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