Martes martes (Linnaeus, 1758)

Marta

Morfologia de Martes martes

 © Miguel Barbosa

Informação detalhada sobre Martes martes

Origem: Nativa
Endémica: Não
Invasora: Não
Protegida: Sim. Anexo III da Convenção de Berna (“espécie protegida”) e Anexo V da Directiva Habitats (“espécie de interesse comunitário cuja exploração e colheita na natureza podem estar sujeitas a medidas de gestão”)
Explorada: Não, mas no passado terá sido perseguida pelo Homem devido à sua pelagem
Perigosa: Não

Descrição geral da espécie
- Morfologia: mustelídeo de tamanho médio (equivalente a um gato doméstico), corpo alongado e cauda comprida, com pelagem maioritariamente castanha[1,2]. A semelhança com a fuinha (Martes foina) pode causar dúvidas na identificação, porém a mancha na zona da garganta é amarela ou alaranjada (branca a creme na fuinha), ocupando apenas uma pequena porção da mandíbula inferior (estende-se até ao início das patas dianteiras na fuinha)[3,4].
- Peso: 0,8-1,6 kg (machos), 0,75-1,2 kg (fêmeas)[1].
- Comprimento corporal: 513-659 mm (machos), 465-572 mm (fêmeas)[1].
- Dimorfismo sexual: pouco acentuado, machos cerca de 11% maiores que as fêmeas[5].
- Fórmula dentária: 3.1.4.1/3.1.4.2[1].

Distribuição e abundância
- Mundial: Distribui-se pela região paleártica, do norte da Península Ibérica até aos Montes Urais e o Cáucaso, e desde Itália ao Círculo Polar Ártico. Também ocorre em ilhas, incluindo as britânicas (Escócia e Irlanda), as baleares (Maiorca e Menorca), Córsega, Sicília, Sardenha e Elba. As populações das ilhas do Mediterrâneo ocidental terão sido resultado de introduções[1].
- Em Portugal: Até finais dos anos 80 desconhecia-se a sua ocorrência em Portugal continental[6]. Atualmente a distribuição é ainda mal conhecida, mas julga-se que esteja restrita ao norte (Minho e Trás-os-Montes) e centro do país[7, 8], representando o limite sudoeste da distribuição da espécie na Europa[9]. Ausente nos arquipélagos da Madeira e dos Açores[4]. Não existem dados sobre tamanho populacional desta espécie no território nacional. No entanto, considerando a abundância de 0,5 indivíduos/km2 na Galiza (Espanha), admite-se que existam 2500 indivíduos maduros. A sua tendência populacional também é desconhecida, podendo localmente encontrar-se em declínio, mas globalmente alguns factores (e.g. expansão do esquilo-vermelho e aumento da mancha florestal autóctone) podem estar a ter um impacto positivo[9].

Ecologia
- Habitat: associada essencialmente a extensas áreas florestais de coníferas, carvalhais ou mistas[4]. A selecção do habitat parece estar relacionado com factores como abundância e facilidade de captura das presas, disponibilidade de refúgios, presença de predadores e nível reduzido de perturbação humana[10]. Em Portugal evita bosques e matagais mediterrânicos, seleccionando positivamente bosques mistos de carvalhos (Quercus robur, Quercus faginea, Quercus pyrenaica), zonas com níveis de precipitação elevados e também associadas à presença do esquilo-vermelho (Sciurus vulgaris)[7,8].
- Hábitos alimentares: predador generalista, que por vezes tende a especializar-se no consumo de micromamíferos, particularmente roedores do género Apodemus[2,11]. A capacidade de trepar permite-lhe complementar a dieta com esquilos e aves (principalmente na Primavera e início do Verão). Pode ainda consumir anfíbios, répteis, insectos e frutos (estes últimos mais no Outono)[4]. A dieta pode variar em função da latitude e da estação do ano[1], reflectindo também a disponibilidade e abundância das presas[11,12]. Em Portugal as referências à sua ecologia trófica são escassas[4].
- Comportamento: Apresenta hábitos essencialmente crepusculares e nocturnos, podendo aumentar a actividade diurna nas épocas do cio e da dispersão dos juvenis[3,4]. Repousa principalmente em cavidades nas árvores, podendo também optar por ninhos e fendas nas rochas[2,4]. A selecção dos locais de descanso é influenciada pelo risco de predação, variando também com a sua disponibilidade e o clima[13]. É considerada uma trepadora exímia e dotada de uma invulgar agilidade, o que se deve à sua cauda que ajuda a equilibrar-se nos ramos e às garras afiadas (as martas são os únicos mustelídeos que possuem garras semi-retrácteis) que permitem segurar-se firmemente aos troncos. Pode também dar grandes saltos, passando de uma árvore para outra com relativa facilidade. A comunicação é efectuada através de mensagens olfactivas libertadas por glândulas anais e abdominais[1] e pela deposição de dejectos em locais conspícuos e elevados, como trilhos[4, 14].
- Organização social: solitária, excepto no período de acasalamento. Factores como a temperatura ambiente, abundância das principais presas, sexo e actividade reprodutiva são cruciais na determinação do tamanho das áreas vitais e dos percursos diários. Na Polónia, durante a maior parte do ano, cada macho patrulha um território que, em média, tem cerca de 3 km2 e no caso das fêmeas pouco mais de 1 km2. Dentro destas áreas, os machos podem percorrer diariamente, em média, quase 6 km e as fêmeas 5 km, sendo qua na Primavera e no Verão as distâncias médias percorridas são mais longas[15,2]. As áreas vitais das populações ibéricas são menores que as do resto da Europa[2]. O rácio sexual é de 1:1[1].
- Reprodução: polígama e com implantação diferida do embrião (como a maioria dos mustelídeos). Isto faz com que, apesar do cio ocorrer de Junho a Agosto, o blastocisto possa implantar-se até ao mês de Março do ano seguinte[1,16]. No período pré-parto a progenitora procura uma toca, geralmente em troncos de árvores, para proteger as crias. Após 30 a 45 dias de gestação nascem entre uma a cinco crias (em média três), com cerca de 30 gramas, pêlo curto muito espesso e sem conseguir ver nem ouvir. Com 34-38 dias abrem os olhos e o desmame ocorre às seis semanas. Entre as seis e oito semanas começam a explorar o ambiente em redor da toca. A partir das 12 a 16 semanas ficam independentes e dispersam. Cerca de um ano depois, podem começar a reproduzir-se, mas é mais comum isso ocorrer apenas no segundo ou terceiro anos de vida[1,4]. No habitat vive geralmente entre 8 a 10 anos, mas em cativeiro existem registos de ter atingido os 18 anos[4,17].

Interesse económico e relação com o Homem
O seu pêlo, com excelentes propriedades térmicas, para além de macio e lustroso, foi muito apreciado pela indústria têxtil. A cauda em particular, com o pêlo geralmente muito espesso, era usada no fabrico de pincéis. Aparentemente a caça com o propósito de servir este interesse económico ainda persiste em alguns locais da sua área de distribuição[4].

Estatuto de conservação e ameaças
- Mundial: “Pouco Preocupante”[18].
- Em Portugal: “Informação Insuficiente”[9].
- Ameaças: as principais são a perda de habitat (principalmente devido à incêndios florestais, exploração florestal, construção de infraestruturas) e a pressão humana[7]. Em determinados locais, também sujeita a mortalidade por atropelamento e a captura abusiva[4]. As populações do noroeste de Portugal parecem estar isoladas reprodutivamente, por estarem afastadas das populações espanholas mais de 60 km e os habitats que as ligam não parecerem ser adequados para a espécie[7].

Acções de conservação
Para conservar a marta é necessário implementar medidas que favoreçam o seu habitat, nomeadamente estratégias de renovação da floresta (e.g. utilizar espécies florestais autóctones) e gestão adequada dos povoamentos adultos (e.g. limpeza de matos para evitar o risco de incêndio). Para além disso é importante aprofundar o conhecimento sobre a distribuição e abundância da espécie, com ênfase na detecção de eventuais descontinuidades[9].

Referências
[1] López-Martín, JM. 2007. Martes martes (Linnaeus, 1758). Pp: 302-304. Em: LJ Palomo, J Gisbert, JC Blanco (eds.). Atlas y libro rojo de los mamíferos terrestres de España. Dirección General para la Biodiversidad - SECEM - SECEMU, Ministerio de Medio Ambiente, Madrid.
[2] Barja I. 2008. Marta - Martes martes. Em: LM Carrascal, A Salvador (eds.). Enciclopedia Virtual de los Vertebrados Españoles. Museo Nacional de Ciencias Naturales, Madrid. Disponível em: http://www.vertebradosibericos.org (acedido Março 2014).
[3] Birks J. 2002. The pine marten. The Mammal Society, Londres.
[4] Matos HM. 2012. Marta (Martes martes): uma trepadora exímia. Pp. 121-129. Em: F Loureiro, NM Pedroso, MJ Santos, LM Rosalino (eds.) Um olhar sobre os carnívoros portugueses. CARNIVORA, Lisboa.
[5] López-Martín JM, Ruiz-Olmo J, Padró I. 2006. Comparison of skull measurements and sexual dimorphism between the Minorcan pine marten (Martes martes minoricensis) and the Iberian pine marten (M. m. martes): a case of insularity. Mammalian Biology 71(1): 13-24.
[6] Proulx G, Aubry K, Birks J, Buskirk S, Fortin C, Frost H, Krohn K, Mayo L, Monakhov L, Payer D, Saeki M, Santos-Reis M, Weir R, Zielinski W. 2004. World distribution and status of the genus Martes in 2000 (chapter 2). Pp. 21-76. Em: DJ Harrison, AK Fuller, G Proulx (eds.) Martens and fishers (Martes) in human-altered environments: an international perspective. Springer, New York.
[7] Álvares F, Brito JC. 2006. Habitat requirements and potential areas of occurrence for the pine marten in north-western Portugal: conservation implications. Pp. 29-46. Em: M Santos-Reis, JDS Birks, EC O’Doherty, G Proulx (eds.) Martes in carnivore communities. Alpha Wildlife Publications, Canada.
[8] Matos H, Santos-Reis M. 2006. Distribution and status of the pine marten Martes martes in Portugal. Pp. 47-62. Em: M Santos-Reis, JDS Birks, EC O’Doherty, G Proulx (eds). Martes in carnivore communities. Alpha Wildlife Publications, Canada.
[9] Cabral, MJ (coord.), Almeida J., Almeida PR, Dellinger T, Ferrand de Almeida N, Oliveira ME, Palmeirim JM, Queiróz AI, Rogado L, Santos-Reis M (eds.). 2005. Livro vermelho dos vertebrados de Portugal. Instituto da Conservação da Natureza, Lisboa.
[10] Clevenger AP. 1994. Habitat characteristics of Eurasian pine martens in an insular Mediterranean environment. Ecography 17(3): 257-263.
[11] De Marinis A, Massetti M. 1995. Feeding habits of the pine marten Martes martes L., 1758, in Europe: a review. Hystrix 7: 143-150.
[12] Rosellini S, Barja I, Piñeiro A. 2008. The response of European pine marten (Martes martes L.) feeding to the changes of small mammal abundance. Polish Journal of Ecology 56: 497-504.
[13] Zalewski, A. 1997. Factors affecting selection of resting site type by pine marten in primaveral deciduous forests (Bialowieza Nacional Park, Poland). Acta Theriologica 42(3): 271-288.
[14] Barja I. 2005. Patrones de marcaje con heces por la marta europea (Martes martes) en el noroeste de España: importancia para su estudio. Galemys 17: 123-134.
[15] Zalewski A, Jedrzejewski W, Jedrzejewska B. 2004. Mobility and home range use by pine martens (Martes martes) in a Polish primaveral forest. Ecoscience 11(1): 113-122.
[16] Mead, RA. 1994. Reproduction in Martes. Pp. 404-422. Em: S. Buskirk, A. Harestad, M. Raphael, R. Powell (eds). Martens, Sables, and Fishers: Biology and Conservation. Cornell University Press, Ithaca.
[17] Macdonald DW, Barret P. 1993. Mamíferos de Portugal e Europa. Guias FAPAS. Porto.
[18] Kranz A, Tikhonov A, Conroy J, Cavallini P, Herrero J, Stubbe M, Maran T, Abramov A. 2008. Martes martes. Em: IUCN. 2008 IUCN Red List of Threatened Species. Disponível em: http://www.iucnredlist.org (acedido Março 2014).
 

Distribuição de Martes martes em Portugal